quarta-feira, 25 de março de 2009

A mágica da classe média


Eu passei o ano passado fora do Brasil, morando na Califórnia. Quando voltei, fiquei abismado com o tanto que o país mudou. Parecia para mim meio mágica, meio inexplicável. De uma hora para outra, dezenas de milhões de pessoas saíram da pobreza e o Brasil, que desde sempre foi dividido entre ricos e pobres (lembra da história do "país mais desigual do mundo"?) de repente virou um país de classe média. Como é que isso foi acontecer? Finalmente encontrei uma resposta, lendo a revista inglesa The Economist da semana passada, que trouxe um excelente dossiê sobre as novas classes médias dos países emergentes.O que descobri é que esse "surto" de classe média não é mágico nem inexplicável. É pura estatística. E é comum na história. Algo parecido aconteceu no século 19 na Inglaterra e nos Estados Unidos. E de novo a partir dos anos 50 na Europa e América do Norte. E está acontecendo agora mesmo na China e na Índia. Em nenhum desses casos, o crescimento da classe média é lento e gradual. É sempre assim, de repente, de uma hora para outra, transformando a sociedade.O gráfico acima, que é típico desses casos, ajuda a entender por quê. Ele retrata a distribuição de renda da China em 1980, 1995 e 2008. A linha vertical vermelha representa o limite a partir do qual se ingressa na classe média. Como o gráfico tem essa forma de sino de cabeça para baixo, fundo no meio e baixinho nas bordas, é de se esperar que haja um aumento súbito nos números quando o meio do sino passa a linha vermelha. No caso deste gráfico, por exemplo, note como a classe média chinesa (pintada de azul claro), que era algo como zero em 1980, de repente domina a maior parte da população (a classe média chinesa passou de 15% para 62% entre 1990 e 2005).Graças a esse surto atual, a classe média pela primeira vez alcançou metade da população mundial. Isso é revolucionário – menos de 10% da população do mundo era classe média em 1900, e em 1980 era algo como um terço do mundo.Classe média consome. E é em grande parte por causa do consumo da classe média – especialmente nos Estados Unidos e na Europa – que o mundo está nesse apuro de aquecimento global e tal e coisa. Se você pegar essa multidão de bilhões de pessoas nos países emergentes que agora estão ingressando na classe média e der a eles padrões americanos de consumo, baubau. A vaca, que já está pastando no brejo, vai atolar de vez.Mas será que precisa ser assim? O dossiê da Economist menciona também o incrível potencial transformador da classe média. Justamente porque consome tanto, essas pessoas têm o poder de mudar a lógica de uma sociedade, usando seu dinheiro como incentivo. A história tem exemplos disso. O melhor deles é do século 19, quando ocorreu o primeiro grande surto de classe média do mundo e pela primeira vez países como Inglaterra e EUA tiveram algo que pode ser chamado de "classe média de massa". Esse movimento acabou pressionando quem mandava nesses países a criar uma sociedade mais justa, mais igualitária. Graças a ele, ganhamos a democracia moderna e consolidamos a idéia de direitos humanos. O que precisamos, agora, é que algo parecido ocorra. Que aproveitemos o impulso de consumo dessas novas classes médias para bancar a criação de uma sociedade sustentável. É nossa única chance.Paro aqui antes que meu post vire um livro, mas quero voltar a discutir na semana que vem a importância das novas classes médias dos países emergentes para a sustentabilidade do planeta. Como sempre, sinta-se muito bem vindo para dar ideias que me ajudem a abordar o assunto.

Por Denis Russo Burgierman
FONTE: http://veja.abril.com.br/blog/denis-russo/

Acadêmica: Veridiane Honaiser

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