terça-feira, 23 de junho de 2009

A Lei Seca está dando certo. Mas precisa melhorar

Após um ano em vigor, a Lei Seca teve alguns resultados expressivos que deixaram o trânsito mais seguro. Mas é importante reforçar e padronizar a fiscalização para evitar que ela caia no esquecimento, dizem especialistas

Aprovada e sancionada sob muita polêmica em 2008, a lei 11.705, conhecida como Lei Seca, que estabeleceu limites mais rígidos para o ato de beber e dirigir, passou nos últimos dias por uma análise minuciosa. Depois de um ano em vigor, completado neste sábado (20), todos querem saber: a lei deu certo? Pode ser aperfeiçoada? Como isso deve ser feito? Ao responder a essas questões, autoridades do governo e especialistas são unânimes em um ponto: o aumento da fiscalização deve ser o aspecto central do sucesso efetivo da Lei Seca.

"A lei teve bons resultados e produziu um debate importante, mas se ela for desmoralizada, será um retrocesso fenomenal", disse a ÉPOCA o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, coordenador da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Para Laranjeira, a única forma de sustentar os dados positivos do primeiro ano da lei é ampliar a fiscalização. "O motorista tem que ter a percepção de que pode ser parado", diz. Segundo ele, o exemplo de outros países mostra que a legislação tem que ser acompanhada de punição aos infratores. "Os países que tornaram a lei mais rígida ampliaram a fiscalização, prendendo e multando mais", diz. No Brasil, segundo a Polícia Rodoviária Federal, 320 mil pessoas foram submetidas a testes de nível alcoólico no primeiro semestre deste ano, sendo que 14 mil estavam embriagadas e 9 mil foram presas em flagrante.

Os balanços nacionais divulgados pelo Ministério da Saúde e pela PRF apresentaram dados que devem ser comemorados. O número de internações em hospitais conveniados ao Sistema Único de Saúde (SUS) provocadas por acidentes de trânsito teve uma redução de 23% nas capitais entre o segundo semestre de 2007 (quando a lei ainda não estava em vigor) e o segundo semestre de 2008 (período que se seguiu imediatamente à sanção da lei). No mesmo intervalo, o número de mortes relacionadas ao trânsito caiu 22,5%, também nas capitais. Segundo a PRF, seu balanço mostra que houve uma mudança no comportamento dos motoristas. A prova disso seria a diminuição do número de pessoas flagradas dirigindo alcoolizadas. No segundo semestre de 2008, um a cada seis condutores submetidos ao teste do bafômetro estava bêbado. No primeiro semestre de 2009, o número foi de um a cada 40 motoristas.

Há, no entanto, o lado ruim das estatísticas. Algumas capitais, como Belém e Teresina, registraram aumento no número de internações. A região Norte teve crescimento de 66% no número de mortes entre o primeiro e o segundo semestres de 2008. Segundo os dados divulgados pela PRF, o número de mortes nas estradas federais caiu apenas 2%, um índice bem inferior à média das capitais. A característica comum que une todos esses dados negativos é a falta de fiscalização. As polícias têm poucos bafômetros na região Norte, e os que existem chegaram apenas após a lei entrar em vigor. O Amapá, por exemplo, não tinha nenhum bafômetro em 20 de junho de 2008. O Mato Grosso do Sul receberá as primeiras 25 unidades na semana que vem. E dos dez mil bafômetros comprados pelo governo federal em dezembro, menos de um décimo chegou aos Estados. O mesmo problema está nas estradas federais. Segundo a própria PRF, há um déficit de 3 mil policiais no país e o número de bafômetros está muito aquém do necessário.

O doutor em Segurança no Trânsito David Duarte Lima, professor da Universidade de Brasília e presidente do Instituto Brasileiro de Segurança de Trânsito (IBST), afirma que é preciso, além de aumentar a fiscalização, especializá-la. "O Estado brasileiro ainda está despreparado para a aplicação da lei", disse Lima a ÉPOCA. "Não há treinamento para os policiais nem uma estratégia de fiscalização", afirmou. O professor da UnB diz que é preciso ainda criar uma padronização da fiscalização, para definir quanto tempo a pessoa pode ser retida para fazer o teste do bafômetro, se pode repeti-lo e o que fazer se deseja realizar o teste por meio da coleta de sangue.

A posição dos especialistas é comprovada por algumas iniciativas de curta duração realizadas no Brasil. O Estado do Rio de Janeiro, por exemplo, intensificou a fiscalização a partir de março e fez campanhas para divulgar a ação. Em poucos dias, foi possível constatar os efeitos do projeto. Na comparação entre 19 e 30 de março de 2008 e o mesmo período em 2009, houve uma queda de 22,15% nos atropelamentos, 14,10% nas capotagens, 12,6% nas colisões e 15% nas quedas de moto.

A percepção sobre a efetividade da fiscalização é a mesma no governo. O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, celebrou na quarta-feira (17) os resultados apresentados sobre a Lei Seca, mas lembrou que há um "grande desafio" pela frente. "É preciso ter em todo o Brasil, em cidades de médio e pequeno portes, a radicalização da fiscalização", afirmou. O mesmo discurso tem o ministro da Justiça, Tarso Genro, que disse na semana passada ver a lei como "o início de uma grande mudança". "Essa mudança tem que ser acompanhada de uma fiscalização muito rígida, que agora está começando a ser feita", disse.

Acadêmica: Franciele Sachet
Fonte: Revista Época / 18-06-02009

Um comentário:

  1. Já é um ano que a lei está em vigor, mas os acidentes continuam acontecendo e o pior cada vez aumenta o numero de mortes. Então, o que adiante ter a lei, se os " bons " motoristas não a cumprem??

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